O Bom Samaritano
PRÆLEGENDUM (Sl. 69/70)
Vinde, ó Deus em meu auxílio, sem demora,
Apressai-vos, ó Senhor, em socorrer-me!
Que sejam confundidos e humilhados
Os que procuram acabar com minha vida!
Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo,
Como era no princípio, agora e sempre,
e pelos séculos dos séculos. Amém.
📖 EVANGELHO de Jesus Cristo, segundo São Lucas 10, 23-27
Então, naqueles dias, Jesus virou-se para os discípulos e disse para eles:
— Felizes são as pessoas que podem ver o que vocês estão vendo! Eu afirmo a vocês que muitos profetas e reis gostariam de ter visto o que vocês estão vendo, mas não puderam; e gostariam de ter ouvido o que vocês estão ouvindo, mas não ouviram.
Um mestre da Lei se levantou e, querendo encontrar alguma prova contra Jesus, perguntou:
— Mestre, o que devo fazer para conseguir a vida eterna?
Jesus respondeu:
— O que é que as Escrituras Sagradas dizem a respeito disso? E como é que você entende o que elas dizem?
O homem respondeu:
— “Ame o Senhor, seu Deus, com todo o coração, com toda a alma, com todas as forças e com toda a mente. E ame o seu próximo como você ama a você mesmo.”
— A sua resposta está certa! — disse Jesus. — Faça isso e você viverá.
Porém o mestre da Lei, querendo se desculpar, perguntou:
— Mas quem é o meu próximo?
Jesus respondeu assim:
— Um homem estava descendo de Jerusalém para Jericó. No caminho alguns ladrões o assaltaram, tiraram a sua roupa, bateram nele e o deixaram quase morto. Acontece que um sacerdote estava descendo por aquele mesmo caminho. Quando viu o homem, tratou de passar pelo outro lado da estrada. Também um levita passou por ali. Olhou e também foi embora pelo outro lado da estrada. Mas um samaritano que estava viajando por aquele caminho chegou até ali. Quando viu o homem, ficou com muita pena dele. Então chegou perto dele, limpou os seus ferimentos com azeite e vinho e em seguida os enfaixou. Depois disso, o samaritano colocou-o no seu próprio animal e o levou para uma pensão, onde cuidou dele. No dia seguinte, entregou duas moedas de prata ao dono da pensão, dizendo:
— Tome conta dele. Quando eu passar por aqui na volta, pagarei o que você gastar a mais com ele.
Então Jesus perguntou ao mestre da Lei:
— Na sua opinião, qual desses três foi o próximo do homem assaltado?
— Aquele que o socorreu! — respondeu o mestre da Lei.
E Jesus disse:
— Pois vá e faça a mesma coisa.
Te louvamos, Senhor!
HOMILIA
Mons. Jonas, eparca para o Brasil
Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Queridas irmãs, queridos irmãos, neste 21º Domingo depois de Pentecostes, a Igreja nos convida a refletirmos sobre a Parábola do Bom Samaritano.
Ouvimos na leitura do livro do Eclesiástico, que devemos honrar o médico, "pois toda a medicina vem de Deus. O farmacêutico faz compostos agradáveis que curam e amenizam a dor". O autor nos orienta a não descuidarmos da nossa saúde, a orarmos pedindo a Deus a graça da cura, mas também a buscarmos o médico. Diz ele: "Oferece um incenso de perfume suave, uma oferenda de flor de farinha e imola vítimas; depois disto, dá lugar ao médico, pois para isso é que o Senhor o estabeleceu". E aqui não estamos falando apenas das enfermidades físicas, mas também das mentais, emocionais, espirituais...
A leitura da carta de São Tiago nos é bastante conhecida: todas as vezes que realizamos o ofício dos enfermos, com a unção do óleo consagrado, nós a recitamos: "Está entre vós algum enfermo? Chame os sacerdotes da Igreja, e estes façam orações sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor; a oração da fé salvará o enfermo e o Senhor o aliviará; se estiver com pecados, ser-lhe-ão perdoados".
Mas é no Evangelho, com a Parábola do Bom Samaritano, que encontramos o ponto alto desta Liturgia. E é aqui que eu gostaria de passar a palavra ao nosso Pai Espiritual, São João de Saint-Denis [Eugraph Kovalevsky], que em 1957, na homilia desta mesma liturgia, na Catedral de Santo Irineu em Paris, disse as seguintes palavras:
“Quem é nosso próximo? Ele não é apenas nossos irmãos de sangue, de ideias ou de fé, de nacionalidade ou de outros laços; ele pode ser estranho para nós em todos os aspectos, a exemplo do samaritano que seguia sua vida separado dos judeus. Meu próximo não é aquele que me beneficia, mas a quem sou chamado a fazer o bem.
Aqui está o primeiro significado desta parábola: Os cristãos têm, portanto, como irmão: a humanidade. Ela é nossa vizinha, nosso próximo. A humanidade é nossa vizinha porque devemos amá-la. Não que ela nos ame, ou nos conheça. Este é o sentido direto e indiscutível da parábola do Bom Samaritano; qualquer mente, mesmo fora da Igreja, pode entendê-lo. Nosso Salvador nos pede para sermos sol. Assim como o sol brilha sobre os maus e os bons, Ele quer que irradiemos compaixão ao universo.
Aqui chegamos ao segundo significado: compaixão. O movimento interno de Deus é a compaixão. É Ele mesmo quem vem ao encontro da humanidade para elevá-la à divindade, num movimento que a tradição ortodoxa chama de théosis, deificação. A graça compassiva de Deus nos santifica, nos diviniza.
Quando a compaixão floresce na alma de uma pessoa, seus ouvidos se abrem para a vida divina. Compaixão pelos pobres, pelos ignorantes, pelos perseguidos, pelos doentes... A compaixão é a força motriz do novo mundo. Vejam, irmãos, a pessoa que sofre é sagrada para quem tem compaixão, não por natureza, mas porque o sentimento de compaixão tem suas raízes no movimento da Trindade, que se despoja de sua grandeza, e vem ao encontro da humanidade sofredora. Ela deseja a felicidade do sofredor, faz curativos nas feridas, leva-a para a pousada, paga adiantado o quarto e se retira. A compaixão é a base da verdadeira cultura cristã. A compaixão põe em movimento o Deus imutável, dobrando os céus para que o Bom Samaritano, nosso Senhor Jesus Cristo, desça entre nós.
E aqui está o terceiro significado desta parábola: o Bom Samaritano é Cristo. Segundo Santo Ambrósio de Milão, o homem meio morto, que foi espancado pelos bandidos na parábola, simboliza Adão, a humanidade caindo nas mãos de bandidos. A humanidade está meio morta e meio viva. Quando entramos na vida espiritual e imediatamente tomamos consciência dessa nossa vida, percebemos que nossa alma está pesada, está dormente, acorrentada às engrenagens deste mundo: nascemos, crescemos, construímos carreira, guardamos bens e riquezas, envelhecemos e morremos. Quão difícil é, então, levantar-se, abandonar este estado meio morto e meio vivo.
O levita e o sacerdote veem o homem ferido e seguem em frente. A antiga lei divina, a metafísica e as religiões anteriores a Cristo, vendo a humanidade meio morta, ignoram-na. Só Cristo, através da sua encarnação, curvando os céus, inclina-se para nós, torna-se próximo de nós. Ele reconheceu a humanidade como Seu filho, agindo conosco como Seu próximo.
“Ele estava de viagem, aproximou-se dele e, ao vê-lo, sentiu-se comovido de compaixão”, diz o Evangelho. Jesus aproximou-se da nossa miséria… Não temeu as nossas feridas, a feiura do nosso pecado, aproximou-se, enfaixou-nos as feridas, derramou óleo e vinho. Estamos diante dos três grandes sacramentos: o batismo cura as feridas dos nossos pecados com as suas faixas umedecidas com água batismal; o óleo da confirmação da crisma fortalece-nos e consola-nos, o Espírito Santo dá-se a nós e ao mundo através do Pentecostes, entra em nós; o vinho, o Sangue de Cristo na Eucaristia, purifica-nos e vivifica-nos.
“Então ele o colocou em seu próprio cavalo e o levou para uma pousada”, continua a parábola. Assim começa a salvação da humanidade depois da Encarnação. Cristo coloca a humanidade no seu próprio Calvário e a conduz à hospedaria: à Igreja.
“No dia seguinte”, diz a parábola, “tirando dois denários, entregou-os ao anfitrião e disse-lhe: “Cuida dele, e tudo o mais que gastares, eu te pagarei quando voltar”. As palavras de Cristo são fáceis de compreender, falam à nossa alma, mas o que são estes dois denários dados pelo nosso Salvador ao hóspede? Santo Ambrósio responde: estes dois denários são o ensinamento de Cristo e os sacramentos. Ensino inesgotável do Evangelho e vida sacramental.
Aqui encerram as palavras de São João.
Meus irmãos e irmãs, aproveitemos a graça divina que ilumina nosso entendimento e nosso coração, para sermos Bons Samaritanos, boas pessoas, compassivas, acolhedoras, misericordiosas, deixemos de lado os juízos, os preconceitos, as barreiras, e sigamos o exemplo de Cristo, que ama a todos e nos diz: "Vinde a mim você que está cansado e sobrecarregado, pois eu te aliviarei".
A Ele seja a glória, o louvor e a adoração, pelos séculos dos séculos. Amém.
ORAÇÃO
(da Coleta, da Divina Liturgia Galicana)
Pai onipotente e misericordioso, que dirigis vosso olhar para nossas fraquezas e enfermidades, nós vos pedimos: enviai-nos o Bom Samaritano, vosso Filho Jesus Cristo, médico de nossas almas e corpos, e derramai sobre vossa Igreja e sobre o mundo o poder de vossa glória, que se manifesta em vossa misericórdia sem medida. Por Jesus Cristo, nosso Senhor, que vive e reina convosco e com o Espírito Santo, um só Deus pelos séculos dos séculos. Amém.
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